sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

A mim parece-me que estaria sempre bem no lugar em que não estou, e este problema de mudar-me é uma coisa que não cesso de discutir com a minha alma.

«Diz-me tu, minha alma, pobre alma friorenta, que pensarias tu de viver em Lisboa? Deve lá fazer calor, e podias regalar-te como um lagarto. A cidade ergue-se à beira d’água; dizem que é construída de mármore, e que o povo tem tanto ódio ao vegetal que arranca todas as árvores. Eis uma paisagem a teu gosto; uma paisagem feita de luz e de mineral, com o líquido para os reflectir

A minha alma não responde.

Baudelaire, «Any where out of the world», O Spleen de Paris

sábado, 12 de fevereiro de 2011

L., Auto-retrato, Oficina de Francis Bacon, século XXI.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

A biblioteca intacta


Encontrei esta fotografia de Holland House. Foi tirada no dia seguinte a uma noite de bombardeamento alemão a Londres, em 1940. O que resta da casa está no meio do parque, a poucas centenas de metros de onde moro. A imagem é da biblioteca, sem tecto, coberta de escombros, mas com as estantes intactas. No meio do entulho, três figuras de rosto encoberto percorrem os olhos e os dedos pelas lombadas dos livros, totalmente absorvidos na leitura de títulos e nomes de autores. Não sabemos os nomes, o que fazem ali ou os livros que levaram consigo para lerem mais tarde no fundo dos abrigos subterrâneos.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Relatório de domingo - Holland Park

Ao fim do dia, os pais começam a reunir as crianças e a encaminhá-las para fora do parque infantil, como pastores. Os pavões sobem para o cimo das árvores, para passarem a noite, num ritual de sobrevivência transmitido por antepassados que viviam entre predadores. São pássaros enormes, sombras enormes entre as sombras das árvores sem folhas. No meio do parque há um edifício em ruínas, destruído por bombas incendiárias em 1940. Na luz do crepúsculo e da iluminação pública alaranjada, parece que ainda está em chamas. Um fogo sem calor. Regressamos a casa rapidamente, expulsos do parque por rajadas de vento.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

2 February 1940

The snow remains, slightly pocked, but the road is clear. I forget to make extracts from the papers, which boom, echoing, emptily, the BBC. Hitler’s speech – Churchill’s – a ship sunk – no survivors – a raft capsized – men rowing for ten or twelve or thirty hours. How little one can explode now, as perhaps one would have done, had it been a single death. But the Black Out is far more murderous than the war. Prices rise twopence then threepence. So the screw tightens gradually; and I can’t even imagine London in peace – the lit nights, the buses roaring past Tavistock Square, the telephone ringing, and I scooping together with the utmost difficulty one night or afternoon alone. Only the fire sets me dreaming – [...]

Virginia Woolf, Diary